Isto ainda funciona?

Pois é. Eis-me de volta, pouco mais de um ano após a última vez. Quando nos despedimos depois do Euro 2024, o plano não era parar por completo… mas acabou por ser isso o que aconteceu.
A verdade é que perdi um pouco de interesse na Seleção neste último ano. Não por completo – tanto quanto mais me recordo, vi todos os jogos. Fui inclusivamente ao jogo contra a Escócia no Estádio da Luz, há quase um ano. Mas deixei de me ralar com quem é Convocado ou não, deixei de tentar distinguir entre críticas legítimas e vieses clubísticos, deixei de defender ou criticar o Selecionador.
Isto pela primeira vez em mais de quinze anos! Aqui entre nós, foi libertador. Houveram alturas em que mal atualizava a página de Facebook, em que quase me esquecia de que haviam jogos. Quando os via desfrutava, no momento, ignorando o barulho. E quando as coisas não corriam tão bem… não me ralava. Como escrevi antes, o tempo e a paciência já não são os mesmos.
E a verdade é que me fartei do ciclo vicioso dos últimos anos: promessas, marketing, imenso apoio por parte da massa adepta, garantias de que temos a melhor geração de jogadores de sempre – para depois, na prática, não se verem resultados. Ou melhor, vermos resultados suficientes para se justificar que nada mude, mas que não satisfazem ninguém.
Dito isto, este último ano não foi nada mau em termos de desempenho da Seleção. Aliás, quando dei por mim, tínhamos vencido a Liga das Nações pela segunda vez. Foi o nosso terceiro título.
Antes da final four, não tinha fé quase nenhuma. Tínhamos tido uns quartos-de-final dramáticos, como era a norma perante a Dinamarca há coisa de quinze anos – à grande e à dinamarquesa, como escrevia eu na altura. Estivemos a quatro minutos da eliminação. Foi uma reviravolta emocionante mas, para sermos sinceros, a Dinamarca não é propriamente um tubarão, com o devido respeito. E quando se soube que o nosso primeiro adversário na final four seria a Alemanha – uma das nossas maiores bestas negras, ainda por cima a jogar em casa – pensei “esqueçam…”
Houve gente a dizer que preferiam que Portugal perdesse na final four, só mesmo para podermos correr com Roberto Martínez. Eu não concordava – nunca torcerei contra a Seleção – mas, aqui entre nós, se Martínez saísse, não me queixaria. O meu entusiasmo e crença eram tão poucos que, quando chegou junho, mal me recordava que haveriam jogos da Seleção.
Não digo que não acreditava de todo. Mas era quase só por princípio, numa de “até ao lavar dos cestos é vindima”.
Pois bem. Os Marmanjos resolveram ganhar-me à Alemanha, vinte e cinco anos e várias derrotas dolorosas depois da última vez. Foi preciso esperar uma geração inteira por outro Conceição – bastaram cinco minutos de Francisco em campo para catalisar a reviravolta.
A final foi perante a Espanha – outra besta negra, que não vencíamos em jogos oficiais há vinte e um anos, que se sagrou Campeã Europeia no ano passado, merecidamente. Outro jogo intenso. Estivemos por duas vezes em desvantagem, Cristiano Ronaldo voltou a sair mais cedo do jogo por problemas físicos (é fim de época, o homem tem quarenta anos! Ao menos conseguiu marcar pela primeira vez em finais). Houve prolongamento, houve penáltis.
Já estou nisto há mais de duas décadas. Nos meses anteriores, garantiria a pés juntos que não me ralaria da mesma forma. Não foi isso que aconteceu nesse dia. Não se torna mais fácil com o tempo, antes pelo contrário. O Ronaldo nem foi capaz de ver os penáltis – I feel you, bro. Nuno Mendes fez uma exibição monstruosa – ele e os colegas do PSG, Vitinha e João Neves, ganharam dois títulos europeus no espaço de uma semana. Nas grandes penalidades, Diogo Costa defendeu o penálti de Morata. No fim, a Taça veio para Portugal.
Como disse acima, isto dura há mais de vinte anos e a Seleção continua a surpreender-me. Passo por fases de maior pessimismo e aqueles Marmanjos arranjam maneira de dar a volta por cima. Daquelas lições que estou sempre a aprender.
Já lá vai quase uma década desde o primeiro título da nossa Seleção. Até agora nenhum soube tão bem como esse, admito. Mas ainda me recordo de quando ainda não tínhamos ganho nada – anos e anos em que só levantávamos um troféu nos meus sonhos. Agora já aconteceu três vezes na vida real. Não deixo de dar valor a isso. E podem dizer o que quiserem sobre a Liga das Nações, mas tivemos de derrotar dois tubarões, dois adversários contra quem raramente ganhamos, para conquistarmos este título.
Felizmente, sinto que desta vez as pessoas deram mais valor que em 2019. Para além da questão dos adversários que enfrentámos, a prova já tem uns anos, já tem algum prestígio. Quem desdenha quer comprar.
À boa maneira tuga, o povo foi do oito ao oitenta. Dias antes estavam à espera da desculpa para correr com Martínez. Depois desta, já se fala do título mundial. Claro.

Acho que ainda é muito cedo para se determinar se já saímos do ciclo vicioso. Até porque nem tudo depende diretamente dos jogadores e/ou do treinador – continuamos a ter calendários muito pesados, não sabemos em que forma os Marmanjos estarão no verão do próximo ano.
Além disso, estamos a falar de um Mundial. Se fosse um Europeu, até alinharia um pouco no otimismo. Mas historicamente Portugal dá-se pior em Mundiais. Apontar ao título poderá não ser muito realista.
Uma coisa é certa, no entanto: depois deste título, Martínez, o resto da equipa técnica, a própria Seleção atual merecem o fim do barulho, do cepticismo, merecem a nossa confiança. Ao mesmo tempo, temos o direito de pedir – para não dizer exigir – mais exibições assim. A Qualificação começa na próxima semana – acho que podemos assumir que não a falharemos. Depois disso, na hora da verdade, se não der para pedir o título, pedimos no mínimo que apontem nessa direção. Que façam uma exibição digna de uma das melhores seleções da Europa. Algo que não acontece em Mundiais há… quase vinte anos, no momento desta publicação.
Agora vamos passar a um registo bem mais triste – o mais triste aqui no blogue até agora. Vocês sabem do que se trata.
Soube da notícia de manhã cedo, quando estava no trabalho. Foi um choque – fiquei sem conseguir respirar.
Nunca considerei Diogo Jota um dos meus jogadores preferidos. Nem sequer sabia que ele tinha um irmão mais novo, também ele futebolista. Era regular na Seleção, no entanto, durante os últimos seis anos. Houve uma altura em que era um dos nossos melhores marcadores. Era uma personagem recorrente aqui no blogue.
Não sei se alguma vez o disse aqui com todas as letras, mas sempre me afeiçoei a jogadores da Seleção – em graus diferentes. Vou acompanhando as carreiras deles, as vidas pessoais (quando se casam, quando se separam, quando têm filhos), ainda que de longe. Vejo-os crescer comigo. São os meus Marmanjos, os meus meninos, as minhas musas.
E do dia para a noite fiquei sem um deles.

Eu sabia – ou melhor, devia ter sabido – que chegaria o dia em que veria um deles partir. E que era possível que um deles partisse demasiado cedo. Não estava preparada.
Aqui entre nós, não me interpretem mal, mas não estava à espera que tanta gente se ralasse com a morte do Diogo. Pelo menos não em Portugal. Ele não era um jogador particularmente mediático por cá. Mas, nessa quinta-feira maldita, fui vendo a consternação espalhando-se entre os meus colegas, entre outras pessoas, pelos meus grupos no WhatsApp, pelo resto da Internet.
Calculo que seja pela dimensão da tragédia. Outros já a descreveram melhor do que eu: dois rapazes novos, com a vida toda pela frente, que deixaram os pais órfãos dos únicos filhos que tinham. O Diogo tinha três filhos pequenos, estava com a mãe deles desde adolescente, tinha acabado de se casar. Duas vidas que se esfumaram num instante. Uma coisa estúpida, aleatória, cruel, Nem o Diogo, nem o André, nem aqueles que os amavam mereciam isto.
Por outro lado, sei de meia dúzia de pessoas, em particular um certo presidente do outro lado do oceano, que mereciam muito mais este destino.
Claro que, pelo menos cá em Portugal, as homenagens e manifestações de pesar acabaram por resvalar para o exagero. Não adoro a cultura portuguesa no que toca ao luto: há uma tendência para o exibicionismo, para a histeria, quase para o tétrico. Não pretendo tecer juízos de valor sobre a forma como cada um lida com a perda – tirando quando interfere com o luto dos outros, quando magoa ainda mais quem já está a sofrer.
Dou alguma legitimidade a quem questionou a ausência de Cristiano Ronaldo do funeral. No entanto, aqui entre nós, de que serviu a polémica? Não aliviou a dor dos entes queridos, pois não? Em relação às críticas à viúva pelo vestido que usou numa das homenagens e aos meios de Comunicação Social sem noção dos limites, só tenho repúdio.
Tirando isso, têm sido feitas homenagens lindíssimas a Diogo Jota – homenagens essas que duram até agora. Havemos de voltar aí – antes, tenho de falar sobre outra perda: Jorge Costa.

Confesso: não estava tão afeiçoada a ele. Mal me lembro dele na Seleção – ele já era “velho” quando comecei a interessar-me por futebol. Ainda assim, tenho uma imagem muito específica dele gravada na memória: levantando a Taça UEFA pelo F.C.Porto em 2003. A RTP incluiu o momento numa montagem de autopromoção que transmitiram inúmeras vezes nos meses que se seguiram – nunca consegui esquecê-la.
De resto, o Jorge fazia parte da Geração de Ouro, à qual pertencem nomes como Rui Costa e Luís Figo. Custa começar a perdê-los.
Esta foi uma morte por causas naturais – infelizmente, o Jorge tinha um histórico de problemas cardíacos. Ainda assim, estava a ter um dia de trabalho normal no F.C.Porto. Deu uma entrevista falando sobre o jogo seguinte, a nova época, as movimentações de mercado. Ter-se-á sentido mal logo depois disto. Passadas umas duas horas, se tanto, já não estava entre nós.
Já viram a maneira como os nossos planos e preocupações do dia-a-dia rapidamente se tornam irrelevantes? Já viram o quão frágeis e insignificantes somos?
Dizia eu que não têm faltado manifestações de carinho e saudade, tanto relativas ao Diogo como ao Jorge. Por outro lado, regra geral, homenagens fúnebres sempre me deixaram dividida. São bonitas, são comoventes, são um consolo para os entes queridos, mas… não teria sido melhor fazê-las quando a pessoa está cá para as ver? Sou daquelas que acredita que homenagens fazem-se em vida.
Nesse aspeto, no que toca à morte do Diogo, foi um pequeno consolo pesquisar este blogue e escrever o que fui escrevendo sobre ele ao longo dos anos. Este é apenas o meu cantinho da Internet, duvido que o Diogo alguma vez tenha dado com ele, mas ao menos deixei-lhe elogios em vida.
Essa é uma das funções da minha escrita, na verdade – deste blogue e não só. Falar sobre as minhas coisas favoritas, cimentar recordações, escrever a História da Seleção segundo o meu humilde ponto de vista, deixar provas da minha afeição pela Equipa das de Todos Nós e pelos seus protagonistas, contribuir para a imortalização.
Tendo tudo isto em conta… será correto continuar a deixar o blogue ao abandono?

Pois. Acho que não.
Não me interpretem mal, não vou regressar aos moldes de antigamente. Mas quero tentar deixar pontos de situação semelhantes a este de longe a longe. Mínimo dos mínimos, quero deixar um antes do Mundial. Ao mesmo tempo, vou fazer um esforço para, pelo menos, ir atualizando a página do Facebook quando há jogos.
Na sexta-feira passada, foram Divulgados os Convocados para a primeira dupla jornada da Qualificação. Esta não vem numa boa altura para mim: tenho planos em ambos os dias de jogo. Mas devo conseguir acompanhar, nem que seja apenas na rádio ou em sites de atualizações. Depois, quero tentar ir a pelo menos um dos jogos de Outubro, no Estádio de Alvalade. Como já terão concluído, a vida é curta, temos de agarrar todas as oportunidades – sabemos lá quantas teremos.
Ainda a propósito disso, Roberto Martínez revelou que, a partir de agora, a Seleção terá sempre um Convocado extra: o Diogo. Ele servirá de motivação, de inspiração, para lutar pelo título no Mundial do próximo ano. Adicionalmente, Rúben Neves, o melhor amigo do Diogo, herdará a camisola 21. Eu quase me desfiz em lágrimas quando vi a notícia.
Mesmo que a minha disponibilidade, quer externa quer interna, seja menor, mesmo que escreva menos e que me rale menos com as miudezas, o meu vínculo com a Seleção Nacional sobrevive e quero cultivá-lo. A vida é tão difícil, têm acontecido tantas coisas horríveis. Se temos algo de bom, há que valorizá-lo.
Como sempre, obrigada pela vossa visita. Até à próxima.