Brinquedos emprestados
No passado dia 14 de novembro, a Seleção Portuguesa de Futebol foi derrotada por uma bola sem resposta pela sua congénere russa, em Krasnodar. Três dias mais tarde, a Seleção Portuguesa venceu a luxemburguesa por duas bolas sem resposta.
Não me vou alongar muito sobre estes jogos. Em primeiro lugar, porque não vi o primeiro jogo e acompanhei o segundo apenas parcialmente, via rádio. Não me sinto à vontade para dar o meu parecer sobre jogos que não acompanhei devidamente. Além disso, pelo que me contaram e pelo que li na Internet, os jogos foram "uma seca brutal", como disse a minha irmã. Se haviam jogos que eu pudesse falhar, eram estes.
Na verdade, mais do que por falhar os jogos em si, tenho pena por não ter podido acompanhar os dias antes. Os treinos, as notícias, as declarações à Imprensa, as fotografias, os vídeos. Sobretudo porque não vamos voltar a tê-los até março.
Dizem que Portugal não esteve grande coisa em termos coletivos frente à Rússia, ainda que tenham havido alguns destaques individuais: Cédric, João Mário, Rui Patrício e, em particular, o jovem estreante Gonçalo Guedes. Ao que parece, a Rússia deu mais importância ao jogo que Portugal, pois terá apresentado a equipa na máxima força e os portugueses apostaram mais em segundas linhas. Acabámos por provar do nosso próprio veneno, pois sofremos um golo ao cair do pano, fruto de um passe infeliz de William Carvalho.
O jogo com o Luxemburgo iria sempre correr-nos melhor tendo em conta o calibre do nosso adversário. Nessa altura, estava no aeroporto e quando consegui ligar-me à Internet e ao relato da Antena1 (a aplicação da RTP não estava a transmitir a emissão televisiva por uma questão de direitos e não dava jeito dar uma de Inácio com o telemóvel), já André André tinha marcado, confirmando o bom momento que tem atravessado esta época. O relatador (Alexandre Afonso? Não tenho a certeza...) queixava-se da dormência da partida, sobretudo durante a segunda parte. Chegou mesmo a garantir que não tinha tomado nenhum comprimido calmante, o relato estava lento porque o jogo estava lento.
Ao menos houve tempo para Nani marcar de livre, no dia em que completava 29 anos. Posso não ter acompanhado está dupla jornada como desejava, mas este golo deixou-me feliz. O resultado ficou em 2-0, o que, depois de mais de um ano de vitórias pela margem mínima, quase sabe a goleada.
Apesar de estes serem jogos pouco importantes, houve espaço para polémicas. Como é do conhecimento geral, hoje há dérbi. Uma das preocupações desta dupla jornada era o desgaste dos jogadores dos clubes em questão nas respetivas seleções. Ora, no jogo com o Luxemburgo, Fernando Santos "copiou" o meio-campo do F.C.Porto. Algo que considerei inteligente, pois poderia contornar um dos problemas mais difíceis das seleções: a falta de rotinas.
No entanto, ao que consta, isso ofendeu o clube, que acusou Fernando Santos de favorecer os jogadores dos clubes lisboetas em termos de gestão do cansaço. Estas queixas irritam-me por vários motivos. Em primeiro lugar, já ficou provado que Portugal foi a Seleção que menos utilizou jogadores dos três grandes. Em segundo lugar, este é um caso típico de "preso por ter cão, preso por não ter" - se, por acaso, a convocatória para esta dupla jornada não incluísse nenhum jogador do F.C.Porto, choveriam de imediato críticas ao Selecionador e à Federação. Em terceiro lugar, pelo ritmo de treino do jogo com o Luxemburgo, quer-me parecer que os Marmanjos tiveram o cuidado de não se cansarem demasiado. Além do mais, o F.C.Porto vai defrontar o Agrense. Se eles não conseguem vencer o Agrense sem Danilo e André André, é mau sinal (como se eu pudesse falar muito, com uma Seleção por vezes Ronaldo-mais-dez, outras vezes Moutinho-mais-dez...).
Por fim, tomo a liberdade de recordar, não apenas ao F.C.Porto mas também a todos os clubes, que depois desta dupla jornada, vão ter quatro meses com os jogadores só para si. Quatro meses sem as seleções lhes levarem os brinquedos emprestados, para depois devolvê-los - segundo os clubes - estragados. Vamos ter Europeu no fim da época. Peço encarecidamente que deixem Fernando Santos em paz nas poucas ocasiões em que este pode trabalhar diretamente com os jogadores. Até porque este diz que quer ganhar o Europeu, o que beneficiaria toda a gente.
Dito isto, não fosse esta polémica, talvez não me desse ao trabalho de escrever esta crónica. De uma maneira retorcida, fica o agradecimento. Estou sempre disponível para defender a Seleção (sempre que concordo com ela, é claro), sobretudo quando certas entidades - o presidente do F.C.Porto costuma ser uma delas - aproveitam todas as oportunidades para, como dizia o nosso antigo Selecionador, debitar as suas postas de pescada.
Fernando Santos já veio dizer que, nos jogos de março, os Convocados estarão mais próximos da Lista Final que irá a França. Ao mesmo tempo, os adversários refletirão a constituição do nosso grupo no Europeu. E, de facto, nesta altura, sinto-se ansiosa pelo sorteio da fase de grupos, por conhecer os adversários e o calendário, pelas primeiras apostas e especulações. Portugal será cabeça-de-série, o que significa que, por uma vez, não vamos ter a Alemanha no grupo - o que, sinceramente, é um enorme alívio. Não precisamos de sofrer mais nas mãos deles, obrigada. Por outro lado, vocês sabem que, por norma, eu desconfio de grupos fáceis, daí que talvez não seja muito grave partilharmos um grupo com uma seleção como a Itália ou a Suécia (que eu não me arrependa de escrever isto...). Além disso, as seleções estreantes no Europeu não terão nada a perder, o que pode ser perigoso.
Não me vou alongar muito mais em especulações sobre o sorteio. Como costumo dizer, os sorteios são provavelmente os únicos aspetos do futebol governados apenas pela Sorte, por Deus, pelo Universo, pelo Destino ou qualquer outra entidade sobre-humana que queiram considerar. Depois de ficar tudo definido, falamos. De qualquer forma, esperam-nos agora seis meses de ansiedade, expetativa, até chegar o mês de maio (dia 16?), sair a Convocatória Final e entrarmos verdadeiramente em ação.